Arquivo | abril, 2009

Texto Avulso II

17 abr

 

Está um dia claro, o céu azul e o sol radiante. É um belo dia para se caminhar, e passeio por algumas trilhas conhecidas, outras nem tanto. Desço uma ladeira íngrime, por um ainda desconhecido caminho sinuoso. Inesperadamente, encontro-me em um mirante com uma vista muito bonita. Eu nunca havia mirado a paisagem daquele ponto da montanha.

Observo a minha volta, para certificar-me a novidade do local. Há algumas flores do campo, balançando-se levemente ao toque da brisa que sopra naquela altura. Vejo então, um pouco mais distante, aproximar-se um homem, abrindo caminho pela vegetação. Parece vagar sem rumo certo, fora da trilha existente e olha para todos os lados. Talvez esteja perdido. Carrega nas costas uma pequena mochila. Em uma das mãos leva um cajado e, na outra, segura uma flor silvestre branca, recém-colhida, a qual de vez em quando aproxima de seu nariz e sorri ao apreciar seu odor.

Olhando bem, talvez o homem não esteja perdido. É provável que seja um morador da região, explorando o espaço e descobrindo recantos. Pois agora, ao chegar mais perto, vejo que ele está de fato contente e despreocupadamente contempla a paisagem distante. É uma figura excêntrica, esse notável desconhecido.

E aproximo-me de tal maneira que ele percebe minha presença. Vira-se para minha direção e, sem surpresas, cumprimenta-me à maneira dos desconhecidos:

– Está um lindo dia, não?

– Pois é. Um belo dia… – fui respondendo, até ser interrompido.

– Um belo dia para caminhar. Estou a vagar por algum tempo, sem saber exatamente onde estou. Você sabe me dizer que lugar é este?

– Eu também não o conhecia. Resolvi pegar uma trilha ainda não conhecida e… – novamente fui interrompido.

– Ah, você também se aventura por caminhos não trilhados?

– Bem, na verdade, raras vezes. Mas hoje resolvi seguir uma destas e aqui estou. Sei voltar, mas também não sei onde estou.

– Aprecio as trilhas menos percorridas. Às vezes, desafio-me a abrir um novo caminho. – e silenciou-se por um longo instante, mirando as montanhas distantes. Resolvi quebrar o silêncio:

– E para onde você está indo?

– Eu vou chegar onde ninguém foi capaz de chegar. – responde-me com o olhar ainda fixo no horizonte.

Enquanto procuro as palavras para me despedir e voltar, sua voz me detém:

– Vou tentar me divertir e aprender o máximo possível nessa viagem. Afinal, é para isso que serve a viagem, não? Ah sim, diversão e  aprendizagem! Eu confio em mim mesmo, levo comigo o suficiente e necessário. – e sacode sua mochila, esboçando um leve sorriso.

– Se você está confiante, então não tem medo de nada? – essa foi a única pergunta possível no momento, embora me arrependa agora, que as palavras me soam estúpidas e inúteis depois de proferidas.

– Confiar não necessariamente significa deixar todo medo de lado. – e então ele volta seu olhar para mim. – Na verdade, nesse momento, tenho um medo. Um medo apenas, eu acho.

– Medo de quê? – e então de repente o homem se parece menos distante, menos estranho.

– Só tenho medo de ter que abandonar a jornada sem chegar lá. Mas também trago uma esperança. – e sorrindo novamente balança sua sacola às costas. – Levo comigo a esperança de que estes caminhos todos, já trilhados e ainda por vir, me tornarão em alguém melhor. E como esta esperança é maior que aquele medo, sigo marchando sob esta maravilhosa condenação de não parar.

– E onde é lá? Onde realmente você está indo? – eu arrisco, surpreso com suas respostas.

– Já lhe disse. Lá é onde ninguém foi capaz de chegar, pois o caminho é individual. Mas é também onde, paradoxalmente, todos vão se encontrar.

Eu, que estou quase me convencendo de sua excentricidade beirando à loucura, tento me despedir:

– Bom, então desejo-lhe sorte na viagem… desculpe-me, como se chama?

– Nomes e rótulos nem sempre dizem muito a respeito sobre quem somos. Mas alguns me chamam de louco. Também desejo-lhe uma boa jornada. E nos reencontramos lá. Lá… – e em seguida vira-se e torna a caminhar, vagando sem se preocupar.

(Brunno, 17/04/2009)