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Alegria e tristeza

17 mar

Nessa época do ano – refiro-me ao período que compreende Carnaval e Quaresma -, geralmente reflito sobre a ambiguidade, sobre uma certa forma de opostos complementares. Embriaguez é Carnaval, sobriedade é Quaresma. Abundância é Carnaval, austeridade é Quaresma. Voluptuosidade é Carnaval, castidade é Quaresma. Apoteose é Carnaval, humildade é Quaresma. Arrebatamento é Carnaval, circunspecção é Quaresma. Alegria é Carnaval, tristeza é Quaresma. O Papa pensa o contrário. Mas Rubem Alves concorda comigo. Ainda bem que assim é, amém! Até porque a tristeza também tem sua beleza…

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Certa vez, disseram uns sábios (Vinícius de Moraes e Baden Powell, em Samba da Bênção) que é “melhor ser alegre que ser triste, alegria é a melhor coisa que existe”. Eu acho que está certo, até porque os sábios costumam ser sensatos. Mas, esses mesmos sábios nos advertiram que a vida não é só alegria, que os percalços hão de surgir e isso faz parte de todo caminho, já que “para fazer um samba com beleza é preciso um bocado de tristeza, é preciso um bocado de tristeza, senão não se faz um samba não”. A vida, como o samba, são tristezas e alegrias colocadas na balança e é justamente por isso que é possível ter esperança.

É mais ou menos o que já haviam dito outros sábios: “Não importa quão longa seja a noite, o dia virá certamente” (provérbio africano).

Muita alegria. E também um bocado de tristeza!

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Para matar a saudade, uma “palhinha” de Samba da Bênção, com o violão mágico de Baden Powell:

Sobre o aniversário

19 set

Nascido a 13 de setembro de 1979, no início dessa semana completei 31 anos de idade.

Esses períodos próximos ao aniversário costumam ser de bastante reflexão e introspecção para mim. Momento em que geralmente faço um balanço do que já foi, do que está sendo, do que poderá um dia ser…

Nem sempre os sentimentos são muito animadores, mas quando a coisa começa a ficar séria demais é bom dar um toque um pouco mais otimista e bem humorado. Ficamos mais velho, mas a vida é assim para todos. O tempo passa sem distinção…

Uma companheira de aniversário (nascida a 13 de setembro de 1830), a escritora Marie von Ebner-Eschenbach certa vez escreveu:

Uma pessoa permanece jovem na medida em que ainda é capaz de aprender, adquirir novos hábitos e tolerar contradições.

Apesar de ficar mais velho, vale a pena ter em mente o que é necessário para se permanecer jovem.

Forever Young

Que você permaneça sempre jovem, apesar da idade.

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[Atualização em 26/09/2010] Certamente a minha incipiente experiência de paternidade também tem me proposto esse mesmo exercício: capacidade de aprender, adquirir novos hábitos e tolerar contradições. Capacidade de aprender a ser pai, de aprender com o novo que surge, de aprender a lidar com novas demandas e a nova e especial função. Adquirir novos hábitos é uma condição intrínseca para os novos pais, que aos poucos percebem a mudança de ritmo e de prioridades em suas vidas. E, em momentos de transição, vez ou outra surgem algumas contradições (a vontade e a necessidade de exercer a função de pai em choque à vontade de se dedicar a algum passatempo, e coisas assim).

Bucolismo homeopático

29 ago

Em algum dia dessa semana, passando por um portão que cotidianamente passo, o porteiro sorridente interrompeu a minha caminhada. Primeiramente, quis oferecer um presente para o João, meu filho que recém nasceu (domingo passado). Em seguida, começou algum assunto que não sei bem qual era, mas que no vaivém das palavras enveredou para o tempo em que ele era funcionário em uma fazenda no interior de São Paulo.

(Nota: Eu sei que Campinas também é interior de São Paulo. Mas quando ele fez referência ao “interior”, percebo que ele quis dar o significado de algum lugar onde muita gente vive na zona rural, em um ritmo de vida mais pacata).

E ele então lembrou-se da fartura de alimentos que cultivava, das viagens à cavalo, das árvores e dos passarinhos. Eu disse a ele que ainda pretendo morar em uma chácara, de plantar um pomar, de cultivar uma horta e ouvir pássaros cantar. Ele disse que concordava, e que gostaria de fazer o mesmo. Rimos juntos e nos despedimos.

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Em outro dia, trafegando por um trajeto há muito tempo conhecido, de repente constatei lucidamente algo que há anos já estava ali: aqueles morros que compunham uma verde paisagem bonita, foram tomados por vários condomínios de luxo, onde se apinham suntuosas casas e onde – agora – o verde inexiste. O espanto foi como se pela primeira vez eu realmente tivesse visto aquela cena já tão conhecida. E percebi em meu coração que eu preferia a paisagem verde de antes…

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Nesse mesmo dia e nesse mesmo trajeto conhecido, passei por um campo onde até alguns dias atrás se estendia majestoso um solar campo de girassóis. Um tapete verde e amarelo bonito que fazia florescer meu sorriso. E então, sempre ao passar por esse campo, eu dizia para mim mesmo: “seria bom eu lembrar de trazer a câmera fotográfica para registrar o esplendor desse campo de girassóis”, mas eu me esquecia da câmera todas as vezes. Dessa ultima vez que passei pelo campo, restava apenas um tapete de terra e de saudades. E percebi em meu coração que amo os girassóis…

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Ontem (sábado), passei por uma árvore estupenda e de florada magnífica. Contemplei-a tão longamente quanto o momento me permitiu. Pensei que provavelmente fosse uma quaresmeira, mas não tinha certeza. E, como pessoa criada na cidade desde pequeno, senti-me um pouco triste por não reconhecer as árvores…

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Hoje (domingo) pela manhã, ocorreu a Corrida TVB aqui em Campinas. Da janela da sala, enquanto tomava café da manhã, pude acompanhar uma pequena parte do trajeto da corrida. Aquela avenida sempre tão movimentada, sempre tão abarrotada de automóveis e barulhos, parecia descansar e se massagear com as passadas dos corredores que pisavam o asfalto. Embora seja um exagero comparar com a cena da Avenida Paulista vazia de carros e cheia de esportistas na São Silvestre, essa paisagem que presenciei na manhã de hoje também é um tanto quanto rara. Algum tempo depois a corrida dos esportistas acabou, e tudo tomou seu lugar com a corrida dos carros.

Senti saudades de voltar a correr, depois de quase um ano sem treinar.

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Country House - Rose Evenson