Leitura: Sidarta

12 mar

Caminante son tus huellas el camino y nada más;

Há algum tempo atrás, ganhei um livro de meu melhor amigo. Trata-se de Sidarta, escrito por Hermann Hesse em 1922, inspirado em sua viagem à Índia 11 anos antes. O enredo é simples e a leitura é fácil.

 

Trata-se da jornada de um jovem brâmane, rico, bonito e inteligente que decide renunciar àquela sua vida e transforma-se num asceta, num peregrino desprovido de bens. E segue-se a narração de sua tortuosa jornada, integrando aspectos materiais e carnais, tentações e sabedoria, rumo à Iluminação.

Apesar de ser uma narrativa curta, a história de Sidarta nos convida a reflexão de temas muito importantes. Retrata de certa forma nossas angústias ocidentais pós-modernas, especialmente o (des)equilíbrio entre o individualismo e a busca por autoconhecimento e sabedoria. Evoca-nos a pensar sobre a essência, sobre a condição relativa que permite o encontro com o Absoluto, sobre o processo de iluminação do ser humano.

Em certo trecho do livro, quando Sidarta encontra Gotama – o Buda histórico – diz a este: “(…) ninguém chega à redenção mediante a doutrina. A pessoa alguma, ó Venerável, poderás comunicar e revelar por meio de palavras ou ensinamentos o que se deu contigo na hora da tua iluminação. (…)” (pág. 50). Esse diálogo expressa muito bem o ponto de vista de Sidarta: a experiência viva é mais valiosa que qualquer doutrina no caminho da sublimação humana. Por isso, após aquele encontro com o Buda, Sidarta buscará experiências sensoriais de modo a integrar em sua jornada os aspectos materiais e espirituais, que ilusoriamente (e dialogicamente) separamos.

 

Nessa jornada, estamos sozinhos. Cabe a cada um encontrar e seguir seu caminho. Doutrinas e mestres podem nos ajudar inicialmente. Mas, para o caminho da iluminação, da sublimação, mestres e doutrinas serão inócuos. A experiência viva – a arte da plenitude e da atenção – é quem de fato nos conduz ao objetivo final e supremo. A atenção ao inesperado, o despertar dos sentidos para as coisas mais simples nos faz compreender que, quando se está atento, qualquer sinal pode ser guia (mestre) em seu caminho.

Há um texto interessante, atribuído ao filósofo Friedrich Nietzsche, que reforça essa lição de sabedoria: “Ninguém pode construir em teu lugar as pontes que precisarás passar para atravessar o rio da vida – ninguém, exceto tu, só tu. Existem, por certo, atalhos sem número, e pontes, e semi-deuses que se oferecerão para levar-te além rio; mas, isso te custaria a tua própria pessoa; tu te hipotecarias e te perderias. Existe no mundo um único caminho por onde só tu podes passar. Onde leva? Não perguntes, segue-o!”.

Ou ainda, como diz o poeta espanhol António Machado: “Caminante son tus huellas / El camino y nada más; / Caminante, no hay camino / se hace camino al andar”. (Tradução livre: “Caminhante são tuas pegadas / o caminho e nada mais; / Caminhante, não há caminho / faz-se o caminho ao andar”).

 

E agora, José?

8 Respostas to “Leitura: Sidarta”

  1. Deni 13/03/2009 às 16:16 #

    Lindo esse texto sobre o Sidarta, parabéns Mano! E sendo este o Sidarta do Hesse, eis aí a coerência de uma pegada deixada na história por esse Ser. Mostrou-nos o Sidarta que a ele foi possível aprender e apreender, deixando uma ficção para nós, mas não para si. Grande abraço! Deni.

  2. Brunno 14/03/2009 às 22:21 #

    Deni, agradeço muito sua visita, seu comentário e sua indicação das obras de Hermann Hesse. Sidarta foi o primeiro, e creio que outros virão, pois o texto realmente sugere muitas questões. Questões que para alguns (eu e você, por exemplo) são importantes, essenciais. Um grande abraço!

  3. Brunno 14/03/2009 às 22:25 #

    Uns dias depois de publicar esse post, acabei lendo um outro texto que, em um trecho, parece-me complementar e ampliar algumas reflexões. Aproveito para compartilhar:

    “Ninguém tem o direito de pensar no seu lugar. O papel de um ensinamento, o papel de uma comunidade ou de uma igreja não é dizer o que devemos fazer, aquilo que é bom e o que é ruim, mas de nos dar elementos para esclarecer o nosso discernimento, para que nós nos tornemos inteligentes, uma inteligência esclarecida e iluminada pela compaixão.”
    (Jean-Yves Leloup)

  4. Raysla Camelo 09/04/2009 às 17:26 #

    Tanta indicação de leitura.
    Eu adoro, mas nem posso te contar quando eu abri um livro pela última vez. Faz tempo, mal me lembro.

    Eu tomei a liberdade de colocar um link pro Olhar Mutante no texto mais recente do meu blog, tá?

    Um abraço!

  5. Mariane 09/04/2009 às 18:39 #

    Olá Bruno!
    Bom, primeiramente gostaria de dizer que adorei teu blog e as coisas que nele escreve. Parabéns!
    Segundo que, além de post, acho que também serve como uma indicação de leitura, para aqueles que buscam o autoconhecimento e desprendimento das coisas não tão importantes da vida. Vou dar uma procurada por este livro sim!
    Um beijo enorme e, desde já, feliz páscoa!^^

  6. Brunno 17/04/2009 às 23:42 #

    Raysla,

    Embora com uns dias de atraso, recebo com alegria a notícia de que você tomou “a liberdade de colocar um link pro Olhar Mutante” num post seu. Sinta-se à vontade para fazê-lo sempre que quiser, ou sempre que achar que algo escrito aqui (Olhar Mutante) pode contribuir com algo escrito aí (no Sutiã Quarenta e Seis).

    Agora a curiosidade está me cutucando para mutantemente olhar o que está escrito no Sutiã.

    Um beijo!

  7. Brunno 17/04/2009 às 23:45 #

    Mariane,

    Que bom que tenha gostado do blog. Seja bem-vinda! Venha sempre “olhar”… visitar e comentar. Com outras “visões”, o Olhar será mais mutante, rico e interessante.

    Fico contente também em saber que este post serviu-lhe como indicação de leitura. De fato, recomendo a leitura de Sidarta. Vale a pena! Como você disse, desperta-nos questões importantes sobre o autoconhecimento.

    Visitarei teu blog e espero que assim iniciemos um “intercâmbio virtual e blogosférico”.

    Um grande abraço.

  8. Leo 19/04/2009 às 13:20 #

    Se quer saber o que está escrito no Sutiã, eu te digo: É tudo do Leo.
    ehehe

    Beijos.

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